A ELIPSE E OS DEFEITOS DE RACIOCÍNIO
Um
dos graus fundamentais do pensamento humano, aliás considerado o maior, é o de
Doutor, mas o que seria aquele que possui o doctum?
Isto é, o grau máximo de ensinamento, porque domina a capacidade de pensar? O que ele tem que possuir muito bem? Uma coisa básica: A capacidade de distinção.
Um
doutor, ou uma pessoa que domina o pensamento, só pode ser como tal, se
conseguir obviamente saber distinguir as coisas, não gerar confusões, saber
concluir, aplicar a dialética e alcançar a verdade por meio de adequada relação
entre os fatos e as coisas.
O
sistema de lógica é assim, saber definir, dentro dos critérios, as coisas, o
que cada uma representa ou é na escala de discurso. Saber conceituar. Saber bem
definir. Saber estruturar. Os que entram em contradição não têm este grau, os
ideologistas também não, os sofistas também, e todo aquele que não faz juz ao
papel que lhe deu o suposto título, pois, sua representação não condiz com a
sua posição científica.
O
professor Mario Ferreira dos Santos bem explicava em sua obra sobre a
cosmovisão, que é mister que tenhamos, para manter a lógica do discurso e o
nível mínimo de pensamento filosófico, a capacidade de diferenciar as coisas e
logo, saber o que cada uma representa no seu lugar, na ordem do pensamento.
Exemplificando:
um livro tem o seu lugar específico não apenas na conceituação, mas num espaço,
e num tempo. O que é um livro? Qual é a sua cor? O seu assunto? Onde ele está?
Quando foi escrito? De que temas discute? E o que ele objetiva? O que conclui?
Estas perguntas são fundamentais para argumentar e para bem dispor o que é uma
coisa no seu ambiente geral, e qual é a sua situação perante as outras coisas.
Aristóteles
começa o seu “Organon” falando
claramente que a lógica depende não da estrutura que ela tem em si, mas de como
as coisas podem ser pensadas nesta estrutura através do idioma. Assim, um
cavalo não deixa de ser cavalo em nenhum idioma, as formas de se dizer cavalo
mudam na cifra, todavia, em essência é o mesmo animal, agora se fossemos falar
cavalo confundindo-o com um asno, ou um burro, teríamos um defeito claro de
raciocínio, porque estamos misturando objetos diferenciados. Trocar objetos com
palavras diferentes é defeito claro de raciocínio.
Esta
mesma posição de classificação, foi muito bem estruturada pela lógica de Lúlio,
ele faz muito bem, quando cria a sua Arts (arte), fazendo-nos perceber que por
meios de perguntas gerais, num esquema montado, conseguimos saber o que é cada coisa,
e como podemos distingui-la, e defini-la, ou seja, determina-la dentro de
termos precisos com o uso da palavra, sem trocas, e sem repetições. Isso é
lógica.
Mas
malograda todas estas definições brevemente por nós destacadas, é claro
imaginarmos que hoje, a palavra Doutor está muito longe na prática das pessoas
que a proferem, porque a principal função que vemos nos portadores de diplomas
é destruir a distinção.
Então
temos inúmeros exemplos, de trabalhos e teses que nos chegaram todos estes
anos, algumas até estudamos brevemente, outras realmente fizemos uma crítica
para os candidatos, e mesmo assim, os seus orientadores não respeitaram o nível
da crítica, mantiveram seus pontos de vista errôneos, simplesmente porque
estavam no “auge” de sua autoridade.
A
verdadeira autoridade em ciência vem da razão, e não do diploma que a aparenta
representar.
Pois
bem, um dos erros fundamentais que encontramos é o defeito de raciocínio que
troca um efeito, ou uma coisa, por outro efeito ou coisa que está distante da
definição. Assim falamos o que seria o homem, e a pessoa diz que o homem é um
fruto do meio. É realmente. Mas o homem não deixa de ser animal, e espírito
juntos, uma pessoa, para depois ser fruto do meio. Logo, se confunde o que é,
com algo que é de sua propriedade, ou de seu efeito distante.
Quando
alguém conceitua longe, o que a coisa tinha que ser, perfaz então um defeito de
raciocínio muito grave a chamada elipse.
Fonte: https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/matematica/o-que-e-elipse.htm
Fonte: https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/matematica/o-que-e-elipse.htm
O
grande gramático nacional João Ribeiro, desenhava as elipses como formas de se
fugir do assunto, quando não se sabe distinguir, ou não se consegue bem
conceituar.
As
elipses tradicionalmente podem ser admitidas como figuras de linguagem, nos
dicionários normais se desenham como se fossem “omissões de palavras que
subentendem”, logo, há exemplos bons de elipses nas questões conotativas,
vejamos alguns:
“O
filho da nação brasileira é o mesmo filho de Adão do longínquo africano”
“O
português atual nasce na mesma região de São Tiago de Compostela”
“O
ativo é o resultado final do conjunto de aplicações provindas do passivo”
São
casos que não se figuram como erros necessariamente, todavia, como formas de se
dizer, pois, a elipse é um tipo de “salto”, como se fizesse uma “curva”, por
isso, a colocação tradicional do dicionário como se fosse realmente “uma
omissão de palavras que subentendem uma coisa ou uma conclusão”.
Logo,
sabemos que o filho da nação brasileira não é filho do Adão diretamente, mas
por gênero provém do primeiro homem, mas muito distante. A elipse tem que dar
um salto. Não deixa de estar certo, mas de um modo imaginário, pois, não posso
dizer que eu, ou você que somos filhos da nação brasileira, somos “o mesmo
filho” do Adão, e ainda do Africano, até porque há controvérsias bíblicas e
científicas sobre o assunto que não cabe a nós aprofundarmos agora.
O
mesmo se daria para o português atual, ele não veio diretamente do
proto-português, mas longe, depois de muitas fases, mormente, de modo simbólico,
se coloca como se fosse, então, se junta algo muito longe com algo atual,
próximo, aqui não deixa de estar em parte certo, mas sabemos que diretamente
não há português atual de São Tiago de Compostela, mas a origem do Português
vem de lá, é diferente. Portanto, de modo avaliativo e direto, a frase não fica
verdadeira, por causa da relação de “salto”.
O
ativo é o valor do capital investido. Não é o resultado das aplicações do
passivo, a não ser de modo secundário, numa questão mais de processo, de
acontecimento, e não necessariamente, por uma questão relação direta. A relação
é pois secundária e juntada de modo errôneo. Se faz uma elipse. O ativo é o
valor dos investimentos, que provem dos valores do passivo e patrimônio líquido
numa ótica de dinâmica. Em verdade ele vem das qualidades de investimentos, e
depois destes gerados pelos financiamentos, o que desenvolve claramente o seu
valor embora possa vir de outros fenômenos, inclusive de todas as dimensões
patrimoniais e dos próprios fenômenos da atividade.
Portanto,
isso são elipses que não estão como posições totalmente errôneas, no modo a
qual apresentamos, só que elas se mantém com relações que foram omitidas,
fazendo um elo muitas vezes insustentável entre a predicação e o sujeito que se
quer adjetivar.
A
elipse em modo conotativo não se mantêm de modo lógico tradicional, mas extra lógico quando a sua posição é
apenas imaginativa, ou conotativa, quando é tentada de ser relacionada com a
posição real ou metódica da ciência ou da filosofia ela perde o seu valor.
Assim
vamos exemplificar algumas por questões de ilustração provindas de teses e
trabalhos acadêmicos que lemos:
“A
pesquisa que realizamos, procurou por meio do sistemas x, desenvolver uma
contabilidade que pudesse avaliar toda a vida demográfica”
“O
objeto da contabilidade, sem dúvida, é a vida humana”
“O
que destrói uma empresa é o livro de entradas e saídas de estoque”
“Por
meio do sistema x, e da plataforma y, conseguimos perceber toda a movimentação
do mercado acionário”
Vemos
claramente que há elipses em todas as frases, o que revela em muitos casos
relações insustentáveis, que geram um “salto”, uma distância entre um elemento
e outro, que não podem se reunir da maneira a qual foram escritas.
Como,
pois, a contabilidade pode estudar a vida demográfica, sendo que este não é o seu
objeto? A pessoa “salta” o seu objeto, por meio de sistemas de informática, e
cria uma “contabilidade” ou se diz criar – porque para fazer uma ciência desta
natureza ter-se-ia que desenvolver uma série de elementos teóricos, com
argumentação teorética, arrumação de leis e princípios, o que sem dúvida não
foi feito - para avaliar a vida
demográfica? A pessoa “pula” e omite uma série de pontos fundamentais
prejudicando, com isso, a forma de raciocínio. E o pensamento se torna torto,
pois, confundir a vida do povo, e a metrização dos cartórios como contabilidade
é falso, ainda se admitindo como se tivesse o caráter realista e metódico da
ciência. Só se aceitando tal coisa num tipo de ilusão mental.
O
mesmo se dá para a suposta tese da vida humana: a contabilidade pode melhorar a
vida humana indiretamente, sobretudo, por meio do seu objeto, ou seja, com os
esquemas definidos de sua gnosiologia, e de seus critérios científicos. A ciência naturalmente tem relatividade no seu
campo de visão que é parcial, um recorte da totalidade e da realidade concreta,
e ela não pode com um objeto apenas dominar o todo. Muito menos a contabilidade
pode estudar a vida humana. Senão a contabilidade não seria contabilidade,
seria biologia, ou até mesmo um tipo de medicina...
Todavia,
neste tipo de falha, a pessoa salta ou pula todas as condições científicas de
nossa matéria, e estabelece a ela um objeto que não existe, que seria mais uma
finalidade consequencial, das últimas, um objetivo longe, de efeito, ou uma consequência
distante da sua gnose, aplicada ao objeto, do que necessariamente seu objetivo
real, destruindo a afirmação pela distância da sua predicação, com o sujeito
que se quer adjetivar que é a contabilidade.
Seria
absurdo imaginar que um livro caixa, ou um livro de estoque destrói uma
empresa. Ter-se-ia que provar que um lápis desaprova um aluno, ou que a cinta
do seu pai veste-o. Sem necessariamente serem usados adequadamente, eles não
representam nada. É o mesmo que dizer que bisturi opera sem médico, ou que uma
pessoa morre por causa de um leito de hospital. O que é falso.
Além
de outros erros de lógica, com relação à argumentação da coisa, temos o erro,
de atribuir a um efeito processual, a um procedimento, toda a falência da empresa,
sem se explicar em pormenores porque isso o seria, e quais elementos que eliminariam
esta posição, ou seja, se cola algo com uma distância muito grande, o que não
perfaz sem dúvida relação direta. O que destrói ou fale uma empresa é o mal uso
da gestão, as condições mercadológicas (algumas mais outras menos), e a
deficiência de sua gestão. Se o livro estoque é apresentado no ângulo de gestão
que seja muito bem apresentada esta questão, pois, dizer que um livro causa a
falência de uma empresa, é elíptico.
Por
fim relacionar sistemas de informática para resolver todo o problema acionário,
é errôneo também. O “todo” problema acionário tem que ter relação com três
coisas diretamente: o número de ações no mercado, o valor do mercado e contábil
de cada uma delas. Poder-se-ia criar um algoritmo
ou modelo matemático para tentar
avaliar isto, mas o valor das ações é muito empírico, ele é mais volátil que a
água, ou que qualquer outro valor contábil. Neste sentido pular todas as relações
abstratas da economia, da sociedade por ações, das condições sociais, políticas
e humanas para atribuir esta relação direta do valor de mercado de uma ação,
pode ser um intento mas não é uma relação direta, e sob os saltos,
desconsiderando estas coisas, se coloca como se fosse elipse claríssima, porque
não se tem um efeito bom a partir dessas condições de pulo. Seria muito melhor
dizer que em suma temos uma possibilidade de mensuração a partir da produção desse
sistema, e indireta, e não o contrário.
A
elipse é um salto, é um pulo, é uma hipérbole muito mal feita, dependendo da
relação que se quer extrair ou da predicação.
Parabéns!!! Perfeito seu texto. 👏👏👏👏
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